quinta-feira, 30 de abril de 2020

A CRIAÇÃO DO MITO HERÓI

Francisco VALDECI Vasconcelos

     No Brasil, desde da Proclamação da República que se trabalha a narrativa da criação de “mito herói”, como uma espécie de salvação da ordem pública. A narrativa sempre modula um mito condutor da espada que vem combater o comunismo, a corrupção, restabelecer o patriotismo e o moralismo. São facetas que todos os mitos carregam na sua imagem. Mas no final, todos produzem efeitos danosos para a liberdade e cidadania da nação.
     Para que o mito crie corpo e se estabeleça junto a sociedade, vários fatores são atribuídos ao momento, para que o alarmismo amedronte e se torne verdade. Cria-se a existência de um mal avassalador que ameaça o presente e o futuro de todos os cidadãos de bem. Assim, atribui-se a existência de um inimigo presente, onde o mesmo é satanizado, ameaçador, apresentado como o responsável, conforme o contexto da época, como o causador de todos os males. Como num conto de fadas, o mito surge com a varinha mágica para nos defender deste mal.
    Para criação do Estado Novo, Vargas criou a ameaça da tomada do poder pelos “comunistas vermelhos”, relatado no Plano Cohen. Para isso, surge Getúlio, o “pai dos pobres”, o que justificava sua ação repressora. Jânio Quadros, surge como o moralizador que vai varrer a corrupção com sua vassoura. A ameaça do Brasil se tornar uma República Socialista defendida pelos militares, empresários e parte da sociedade tinha o objetivo de tirar João Goulart do poder e instalar o governo militar. A ameaça comunista sempre esteve presente nos momentos de crises no país, que serve como pano de fundo para o surgimento de um mito.
     Cria-se um inimigo a ser abatido, desmascarado e combatido. Se tem um vilão a ser combatido, se faz necessário a criação de um “mito herói”, que seja forte, destemido e íntegro. A figura de um mito que pela sua moral, sua integridade, foi o escolhido para a missão de salvar o destino da pátria, o famoso Salvador da Pátria.
     A moral, a integridade, a honestidade, o nacionalismo são prerrogativas vitais para a construção do mito. Foi o discurso da moralidade defendido por Carlos Lacerda e sua turma da UDN que combatia a corrupção no segundo governo de Vargas, onde o governo era tachado de um “mar de lama” e que o país era governado por ladrões, foi mote permanente contra o governo de Vargas.
   Após a redemocratização, surge um novo mito, a figura de um homem jovem, atleta, forte e destemido que tem as cores da bandeira em seu slogam de campanha, mais uma vez o nacionalismo entra em cena. Collor, com sua arma de uma bala só, defendia a cruzada contra a corrupção e a inflação e se denomina como caçador de marajás.
    A Lava Jato, símbolo maior da moralidade usada pela direita conservadora, fez uso dos mesmos atributos para destruir seus “inimigos”, surgiu com os mesmos vícios do passado, ou seja, a construção de um novo mito que fosse capaz de negar as políticas públicas sociais do governo anterior. Neste nacionalismo exacerbado, surge a figura de Bolsonaro, um patriota convicto, temente a Deus, defensor da família e dos bons costumes, que nega a atual política e se apresenta como “o novo”, como o único, o predestinado que veio com a missão de combater o mal da corrupção e salvar a pátria.
   Toda encenação para criação do mito, do salvador da pátria, tem como pano de fundo, o nacionalismo e o patriotismo. Este patriotismo forja um sentimento de identidade nacional. Em quase todas as encenações, cria-se a imagem de um ator presente no sistema dominante, ou um a serviço dele, porém, com uma nova roupagem que o diferencia dos demais atores políticos. A maquiagem disfarça, mas não muda o personagem.

Por: Francisco VALDECI Vasconcelos
Graduado em História pela Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA – Sobral CE.